Como lidar com o ghosting ou sumiço em relacionamentos? – 07/07/2024 – Equilíbrio


Cerca de uma década atrás, Brenna Holeman teve o encontro perfeito com um homem que conheceu em um aplicativo de relacionamento. Era uma noite chuvosa em um bar aconchegante de Londres, e antes mesmo do encontro terminar —com um beijo— eles fizeram planos para o próximo.

“Ele até me mandou uma mensagem naquela noite dizendo: ‘Não consigo parar de sorrir'”, lembra Holeman, 40, uma escritora de viagens que agora mora no Canadá. Ele também escreveu: “Mal posso esperar para te ver de novo”, diz.

Mas quando ela mandou uma mensagem para confirmar o horário do próximo encontro, houve um silêncio total.

O ghosting, termo popular para o sumiço sem explicação, tornou-se uma parte inevitável dos relacionamentos modernos. E pode ser ainda mais difícil de aceitar do que uma rejeição direta porque envolve incerteza, afirmam psicólogos e pesquisadores.

Elizabeth Earnshaw, terapeuta familiar e de casais da Filadélfia (Estados Unidos), diz que as pessoas que recebem um ghosting começam a questionar sua realidade.

“Eles olham para trás e dizem: ‘Onde eu perdi os sinais? O que há de errado comigo que achei que nos divertimos tanto no nosso último encontro?'”, diz Earnshaw.

Ela viu muitos clientes —de várias idades, gêneros e orientações sexuais— lidando com uma “crise de autoestima” após lidarem repetidamente com o ghosting. Mas em um mundo acelerado de aplicativos de namoro e opções intermináveis, será que é aceitável sumir?

Terapeutas, pesquisadores e uma especialista em etiqueta contam quando você pode sumir com a consciência tranquila e as maneiras de contornar isso.

MENSURANDO AS CONSEQUÊNCIAS

Embora o ghosting ainda seja uma área de pesquisa relativamente nova, alguns dados estão começando a surgir. Em um estudo de 2019, 1 em cada 4 dos participantes disseram que já levaram ghosting de um parceiro romântico, e um pouco mais de 20% disseram que eles mesmos já fizeram isso com alguém.

Outro estudo pequeno, que analisou especificamente usuários de aplicativos de relacionamento, apontou que 85% já receberam um ghosting em algum momento, o que levou muitos entrevistados a se sentirem tristes ou irritados e a terem uma autoestima mais baixa; alguns também se sentiram mais desconfiados com o mundo.

Pessoas que foram “ghosted” têm uma tendência a remoer, se perguntando: “O que está acontecendo? Por que essa pessoa não está respondendo a mim?”, diz Richard Slatcher, professor de psicologia na Universidade da Geórgia que estuda relacionamentos. “Junto com isso, há uma real falta de encerramento para as pessoas.”

Terapeutas como Earnshaw têm visto as consequências desse sumiço em suas práticas há anos, especialmente à medida que as pessoas se cansam dos aplicativos de namoro. As pessoas realmente não deveriam sumir se puderem evitar, por causa da dor que pode causar, especialmente quando acontece repetidamente, diz.

Ela afirma que seus clientes perguntam “estou fazendo algo que está criando isso repetidamente?” ou ainda “como posso ser tão sem valor a ponto de alguém não se importar em dizer adeus?”.

QUANDO CONSIDERAR SUMIR

Ainda assim, há momentos em que é apropriado, até sábio, sumir, dizem os especialistas. Se a pessoa foi agressiva ou fez você se sentir inseguro, você está justificado em se afastar sem explicação, afirma Earnshaw. Ela também deu sinal verde se a pessoa simplesmente não está respeitando seus limites.

“Se não estão ouvindo o que você já expressou, acho que está tudo bem”, diz Earnshaw, acrescentando que hesita até em categorizar essa situação como ghosting.

No estudo que descobriu que a maioria dos usuários de aplicativos de namoro já foram “ghosted”, os motivos que as pessoas deram para desaparecer foram complexos: Alguns o fizeram porque temiam comportamentos verbalmente abusivos ou até mesmo de perseguição; outros disseram que não sentiam que deviam nada à pessoa com quem estavam conversando em um aplicativo; e alguns disseram que não queriam magoar ninguém ao rejeitá-los verbalmente.

“Às vezes, para a pessoa que está desaparecendo, é simplesmente mais fácil”, diz Rachel Sussman, psicoterapeuta na cidade de Nova York e autora de “The Breakup Bible”. “Ninguém gosta de dar más notícias”.

Earnshaw diz que uma pergunta útil a se fazer antes de dar ghosting em alguém é: estou pensando em sumir dessa pessoa simplesmente porque quero evitar uma conversa desagradável? Se a resposta for sim, é mais gentil oferecer uma despedida e até mesmo uma breve explicação.

UMA ABORDAGEM MELHOR

Se você teve apenas um ou dois encontros, um texto terminando as coisas geralmente é suficiente, diz Elaine Swann, especialista em etiqueta em Carlsbad, Califórnia. Ela reconhece que esse conselho pode ser surpreendente vindo de alguém rigoroso com as boas maneiras, mas diz que a etiqueta evolui.

Mantenha-o breve, ela recomenda, algo como: “Não acho que combinamos, mas desejo tudo de bom para você e espero que encontre a conexão que está procurando”. Se, no entanto, você saiu em mais de um encontro ou teve intimidade física de alguma forma —”mesmo que seja só ficar!”— Swann acredita que terminar pessoalmente ou com uma ligação é mais apropriado. (Ou, se você não consegue fazer isso, ela diz que uma mensagem de correio de voz poderia funcionar) É importante que a outra pessoa ouça sua voz e seu tom, diz Swann. E não tente “consertar” a pessoa ao sair.

“Você não precisa transformar isso em um momento de aprendizado”, diz ela.

Sussman afirma que frequentemente diz aos seus clientes que mesmo que tenham tido um encontro realmente bom (ou vários), eles podem se proteger contra a mudança emocional simplesmente dizendo a si mesmos antecipadamente que talvez não saberão da pessoa novamente.

Lembre-se de que ser ignorado infelizmente agora é “normal” e “acontece com todo mundo”, diz ela, acrescentando que ouviu essas histórias de clientes de todos os tipos.

Mas seja gentil consigo mesmo. Os dias e semanas após ser ignorado são um bom momento para praticar o autocuidado emocional, diz Earnshaw. Ver amigos, escrever em um diário, se dedicar a um hobby ou se movimentar, afirma.

Ao mesmo tempo, você pode ajudar a diminuir o dano à sua autoestima simplesmente se lembrando —quantas vezes precisar— de que provavelmente não foi sobre você, diz Sussman.

Depois de seu encontro perfeito em Londres, Holeman levou um ghosting mais uma vez de alguém com quem estava saindo há meses. Ela escreveu sobre suas experiências quase uma década atrás em um post que se tornou o mais popular dela, e os leitores compartilharam suas próprias histórias de serem ignorados.

Abrir-se sobre as experiências foi catártico e revelador para ela, enquanto se recuperava de sua “espiral de ansiedade”. A confusão e mágoa do início diminuíram, e ela percebeu que o silêncio às vezes fala bastante.

“Essa pessoa estava mostrando quem era”, diz. “Ele estava me mostrando que era imaturo, ter falta de empatia e nem conseguir se dar ao trabalho de enviar uma mensagem rápida.”

“A maior realização para eu seguir em frente foi: ‘Nenhuma resposta é a resposta’.”



Fonte: Folha de São Paulo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

?>