Imagine um exercício em que vários cenários possíveis são simulados a fim de estimar a probabilidade de que um determinado cenário aconteça. Agora imagine que o que está sendo simulado são combinações de vários fatores que podem resultar em uma pandemia. Esse exercício foi feito e os resultados publicados em novembro de 2023.
O estudo estima que há 4,2% de chance de que uma nova pandemia aconteça no próximo ano, causando a morte de 10 milhões de pessoas ou mais. Considerando os próximos cinco anos, a chance aumenta para 19%. Considerando os próximos 10 anos, a chance passa para 35%.
Caso o cenário fosse de uma pandemia que causasse um milhão de mortes ou mais, a chance de que a mesma aconteça é de 6,3% em um ano, 28% em cinco anos e 48% em dez anos.
Já há um consenso de que uma nova pandemia vai acontecer, ainda que não se possa afirmar qual o patógeno será o causador. Muito provavelmente, entretanto, a mesma deve ocorrer ainda este século.
A pandemia de Covid-19 deixou claro o despreparo de grande parte dos países. Há três atividades cruciais que precisam estar estruturadas para o enfrentamento de epidemias e pandemias.
Primeiro, a prevenção, cuja vigilância é a peça-chave. Isso inclui vigilância genômica para identificação de patógenos e cepas circulantes, vigilância de casos de febre de origem desconhecida e vigilância de animais, já que a grande maioria das pandemias foram causadas por zoonoses. Uma função crítica da vigilância é produzir um sistema de alerta que permita que o sistema de saúde se adapte ao aumento da demanda por serviços em tempo hábil.
Segundo, a preparação, ou seja, o que deve acontecer para que haja uma resposta rápida a emergências, sejam elas um surto, epidemia ou pandemia. Uma boa preparação implica na rápida detecção de surtos e de seu agente causador, na rápida aquisição de insumos, na capacidade de subsidiar a resposta (através da análise de dados coletados pela vigilância) e na estrutura para desenvolvimento de testes rápidos e vacinas.
Terceiro, a resposta, que inclui contenção (interromper a transmissão), supressão (minimizar a transmissão) e mitigação (adoção de medidas sociais e de saúde pública, além de tratamento). Se por um lado a contenção nem sempre é viável (dependendo do patógeno), por outro lado a efetiva contenção e supressão demandam um sistema de alerta eficaz.
No Brasil, se as lições da pandemia de Covid serviram de ensinamento, deveria haver uma discussão sobre a necessidade de se criar um órgão, vinculado ao Ministério da Saúde, porém com governança independente (tal qual a Anvisa), responsável por coordenar os esforços de prevenção, preparação e resposta a emergências de saúde pública (por exemplo, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos e da Europa).
Tal órgão seria inovador no Brasil, ainda que parte do esforço seria estruturar redes cujos nós já existem, tais como laboratórios, universidades e centros de pesquisa. Tornaria o SUS (Sistema Único de Saúde) mais forte e o sistema mais resiliente a emergências. Seria o caminho para enfrentar futuras emergências de forma totalmente oposta ao que se viu durante a pandemia de Covid, quando municípios enfrentaram a pandemia, sem qualquer preparo, articulação ou coordenação com outras áreas.
O Brasil tem os meios, a capacitação técnica, e parte da infraestrutura para criar um centro de controle e prevenção de doenças, responsável pela prevenção, preparação e resposta a emergências de saúde pública.
Após mais de 700 mil mortes por Covid-19, e com o risco real de uma nova emergência acontecer num futuro não distante, fortalecer a capacidade de responder a emergências é tarefa prioritária.
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