Quatro setores da economia e uma pressão: reverter as perdas na reforma tributária

imposto sobre o valor agregado - IVA


Os setores da atividade produtiva que se sentiram prejudicados com o texto final do projeto de regulamentação da reforma tributária, aprovado pela Câmara dos Deputados em julho, estão tentando reverter alguns tópicos depois que o projeto chegou ao Senado.

Ao menos quatro setores estão se mobilizando por meio de lobbies junto a senadores para tentar obter alguma mudança: saneamento, imobiliário, agronegócio e o setor de Serviços. O PLP 68/2024 detalha as regras de unificação dos tributos sobre o consumo, os casos de diminuição da incidência tributária e normas para a devolução do valor pago, conhecido como cashback.

A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), presidida pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), vai coordenar o grupo de trabalho encarregado de debater o PLP e apresentar sugestões ao texto da Câmara. A possibilidade de mudanças radicais, porém, é remota.

Como os deputados estipularam que a alíquota padrão do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), o novo imposto único a ser criado em substituição ao modelo atual, terá de ser de 26,5%, qualquer mudança nos tributos sobre o consumo que beneficie os setores que agora atuam no Senado forçará a uma compensação para cima de alíquotas aprovadas na Câmara.

A regulamentação é uma exigência da Emenda Constitucional 132, promulgada em dezembro, que estipulou a substituição de cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) por três: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo.

A Abcon, associação das operadoras privadas de saneamento, um dos setores que se consideram mais penalizados com o texto final do PLP, anunciou na terça-feira, 17 de setembro, o teor da carta-manifesto “Ninguém pode ficar para trás”, que traz um apelo para que o setor seja equiparado à saúde na regulamentação da reforma tributária e, assim, mantenha a neutralidade no novo regime.

Juntamente com outras entidades que representam o setor de infraestrutura, a Abcon participa na quarta-feira, 18, de uma audiência pública na CAE do Senado sobre os impactos da regulamentação da reforma tributária. O objetivo é divulgar a carta-manifesto no evento, para sensibilizar os senadores visando a manutenção da neutralidade no novo regime.

De acordo com o documento, o saneamento terá uma brutal elevação da carga tributária, dos atuais 9,75% para 26,5% se o texto da reforma tributária for regulamentada como está. Entre as consequências, a entidade prevê alta média de 18% nas tarifas de água e esgoto e a necessidade de revisão de todos os 4 mil contratos de concessão vigentes no País.

A Abcon prevê ainda o inevitável comprometimento do prazo de universalização dos serviços, prejudicando milhões de brasileiros que ainda não têm acesso a saneamento básico. Outro efeito seria a oneração média de 6,5% na tarifa social praticada pelo setor, afetando um benefício dirigido a quem mais precisa do serviço.

“Um aumento substancial da carga tributária seria catastrófico para o setor, justamente no momento em que temos uma janela de oportunidade de expansão de investimentos, a partir da segurança jurídica trazida pelo marco legal do saneamento”, afirma Christianne Dias, diretora-executiva da Abcon.

Outros setores

Cristiano Luzes, sócio do escritório Serur Advogados, aponta o setor imobiliário (cuja carga tributária média atual está entre 6,4% e 8%) como um dos mais afetados pelo texto aprovado na Câmara, porque a tributação é baixa no setor de incorporação e construção.

Luzes explica que, tradicionalmente, o Brasil não tributa operações de bens e imóveis. A arquitetura da tributação no Brasil é IPI e ICMS para mercadorias, ISS para os serviços e ITBI para imóveis. Agora, com a reforma, haverá IBS e CBS que vão incidir também para imóveis. Por isso, o setor tem trabalhado muito para conseguir uma redução da alíquota.

“O projeto aprovado prevê uma redução de 40% na alíqutota”, diz Luzes. “O setor argumenta que a alíquota justa para poder proporcionar uma transição sem aumento da carga tributária efetiva dos imóveis para as pessoas deveria ter uma redução de 60%, portanto, uma redução similar, por exemplo, a da educação.”

Neste sentido, são usados argumentos de ordem social, em termos de justiça, para poder justificar dizendo que a educação é tão importante quanto a moradia, ambos são direitos sociais e portanto ambos teriam de ter a mesma redução da alíquota. Segundo Luzes, a discussão é técnica.

“O que a nova tributação precisa ter é refletir na alíquota final sobre os imóveis exatamente o custo que é carregado na cadeia pelo chamado resíduo tributário, que é justamente este tributo em cima de tributo que vem carregado nos materiais de serviços contratados que tornam possível a construção de um imóvel no Brasil”, acrescenta, ressaltando que este é o foco do debate.

Morvan Meirelles Costa Junior, sócio do escritório Meirelles Costa Advogados, chama a atenção para o lobby do agronegócio, tradicional no Congresso. Ele afirma que a pressão no Senado ocorre apesar de o PLP ter aprovado alíquota zero para produtos da cesta básica e um redutor de 60% de produtos alimentícios.

“Embora o segmento de alimentos processados tenha sido enquadrado pelo imposto seletivo, com alíquota máxima, o segmento do agronegócio de forma geral foi um dos mais beneficiados, mesmo assim deve dobrar sua carga média atual, de 6%, o que deve brigar por mais inclusão na cesta básica para neutralizar o impacto”, diz Costa Junior.

Por fim, outro setor prejudicado é o de serviços. Como o maior gasto do setor é com despesas de salários dos funcionários, o segmento não foi beneficiado pela maior mudança prevista no novo regime tributário: a possibilidade de deduzir os tributos de insumos ou despesas da cadeia anterior como forma de compensar o tributo maior, unificado a ser pago, como vai ocorrer com que fabrica ou vende produtos.

Por isso, o PLP aprovado tem gerado grande preocupação entre os profissionais liberais. Atualmente, esses profissionais pagam um imposto limitado pelo teto do ISS (Imposto Sobre Serviços), com alíquota máxima de 5% sobre o valor da nota fiscal.

A alíquota projetada para a tributação dos bens e serviços passará a ser de 27%, o que, em razão da previsão constitucional de redução de 30% sobre a alíquota aplicável aos profissionais liberais de profissões regulamentadas, implicará em uma tributação de aproximadamente 18,9% do valor das notas fiscais emitidas por esses profissionais.

“Este aumento representa um desafio significativo, especialmente para aqueles que hoje pagam um valor fixo ou uma alíquota bem inferior, e que não utilizam muitos insumos em sua atividade, o que poderá impactar diretamente sua capacidade de operar de forma competitiva e rentável”, adverte Josiane Minardi, sócia do escritório Minardi, Vieira, Borges e Föppel Advogados Associados.



Fonte: NeoFeed

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