Nova York – Com uma audiência dividida entre brasileiros e estrangeiros, o Brazil Climate Summit (BCS) foi realizado na quarta-feira, 18 de setembro, em Nova York, e abriu a semana que acontece em Manhattan dedicada às discussões sobre mudanças climáticas.
Os dez painéis do BCS mostraram que o Brasil é um país altamente cotado pelo mundo para liderar uma transformação energética, em grande parte por sua imensa gama de recursos naturais. Mas esse potencial só será alcançado se houver uma combinação de fatores, como a originação de negócios voltados, e a combinação de investimentos públicos e privados.
“Nós estamos vivenciando diversas dificuldades voltadas para o clima no Brasil durante este ano todo e sabemos que o momento de agir é agora, não dá mais para esperar”, afirma Luciana Ribeiro, fundadora da eB Capital.
“É preciso mudar a narrativa. Nós precisamos muito mais de investimentos do que de financiamento, o que é bem diferente. Esse é o assunto do momento na mesa”, complementa.
A seguir, confira o que foi destaque no evento.
O caminho global para o carbono neutro
O carbono neutro é uma preocupação que está posta na mesa dos investidores. O Brasil está posicionado como o quinto maior emissor de gases que causam o efeito estufa. 70% desses gases são originados pela combinação da agricultura, desmatamento e outros usos da terra.
Já é possível perceber que já existem algumas empresas pensando nesse segmento e que setores como o de energia renovável estão avançando no País, mas isso não chega perto de ser suficiente.
“Nós estamos percebendo uma movimentação forte do mercado em prol dessas iniciativas, isso pensando no setor público, em fundos de investimentos e também corporações. Com isso, até 2030, esperamos que os investimentos no segmento cheguem a US$ 3 trilhões só para a transição energética”, diz Marcelo Pasquini, diretor de sustentabilidade do Bradesco.
O desafio é inserir a sustentabilidade nos planos e não fazer planos sustentáveis. Isso significa que o governo pode ser responsável por políticas públicas e direções para essas iniciativas, mas quem vai realmente fazer o sucesso da economia verde é o setor público.
“Neste segmento, nós vamos conseguir o sucesso por conta do setor privado e não do público. O governo precisa ser proativo e participar das iniciativas, mas sem o suporte de outras empresas e organizações, isso não será possível. Nem nos Estados Unidos, nem no Brasil”, diz Nili Gilbert, vice-presidente da Carbon Direct.
Clima, IA e data centers no Brasil
Uma das discussões mais quentes foi sobre a adoção desenfreada da inteligência artificial (IA), que pode ser muito prejudicial para o meio ambiente em razão de os data centers consumirem muita água e energia para funcionar.
“Para se ter uma noção, a IA usa a mesma quantidade de energia necessária para uma carga total do seu smartphone apenas ao criar uma imagem”, afirma Jen Huffsteller, diretora de sustentabilidade de produtos da Intel.
“Nesse sentido, ter data centers no Brasil poderia ser uma possibilidade, pensando em sua vasta gama de recursos naturais, porém isso custa”, complementa.
Em sua visão, para solucionar a questão do uso excessivo de recursos, o caminho é criar pequenas provedoras de IA, que atuam em setores e empresas específicos, o que reduziria parte do problema visto por gigantes como OpenAI, Google e Meta.
Sem querer entrar apenas no lado negativo, Huffsteller ressaltou que a tecnologia pode e deve ser usada para auxiliar no processo de descarbonização e transição energética, como já vem sendo explorada em diversos países.
O futuro do combustível alternativo
O painel mais movimentado tratou da SAF, combustível alternativo ao combustível aeronáutico de origem fóssil. Embora o potencial do Brasil em liderar a transformação do setor seja inegável, ainda existem diversas dúvidas sobre a viabilidade desse processo e seu retorno financeiro.
“Na Raízen, nós desenvolvemos uma tecnologia que consegue transformar o etanol em SAF, o que facilita esse processo”, afirma Paula Kovarsky, diretora de estratégia da companhia.
“A ideia é que a gente consiga fazer o mesmo que fizemos com o etanol no Brasil, reduzindo a pegada de carbono e o uso de recursos naturais em sua produção. Queremos replicar isso no SAF”, complementa.
O desafio é justamente esse: produzir esse combustível requer padrões sustentáveis, algo que, neste momento, se mostra inviável investir em um composto que não agride o meio ambiente.
Ainda é preciso buscar por investimentos, que, na visão do UBS, se mostraram pouco viáveis financeiramente para os bancos. Nesse sentido, as pequenas companhias são essenciais para suportar a produção do combustível.
Investimento em clima no Brasil
O Brasil está em sexto lugar no ranking dos países que mais investem na transição energética, destinando em torno de 2% de seu PIB. Para conseguir avançar nesse indicador, especialistas acreditam que é necessário ter o apoio público e privado, sem contar com investimentos internacionais.
Para mudar esse cenário, é preciso ter projetos de mudanças climáticas com track record para atrair investidores.
“Se nos limitarmos a fundos, a decisão do investidor se torna simples: ele procura um histórico de sucesso, especialmente em iniciativas climáticas. Além disso, é crucial que haja projetos disponíveis para esses fundos investirem”, Andrés Ackermann, head da divisão de instituições financeiras do IDB.
Para vencer a corrida verde
A diretora do BNDES, Luciana Costa, e o presidente da APEX, Jorge Viana, não têm dúvidas sobre a força do Brasil no mercado internacional. O fluxo do comércio exterior brasileiro deve atingir US$ 1 trilhão nos próximos três anos, um indicativo do potencial do País.
“Nós precisamos dar as possibilidades para que os Estados Unidos invistam ainda mais no país e nos tornar um fornecedor de transição energética para eles, já que, no fim, eles são os nossos maiores parceiros nessa batalha”, diz Jorge Viana, da Apex.
Por fim, as expectativas se voltam para a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, chamada de COP30, que ocorrerá em Belém, no Pará.
Para os executivos que participaram do evento, essa é a oportunidade do Brasil se mostrar para o mundo e deixar claro que existem iniciativas que valem ser avaliadas por todo o mundo. Porém, até lá, há muito trabalho pela frente.