Um estudo assinado por pesquisadores da Fiocruz Amazônia (Fundação Oswaldo Cruz) e da Unicamp (Universidade de Campinas) aponta que uma nova variante do vírus que transmite febre oropouche (Orov) se replicou cerca de cem vezes mais em células de mamíferos em comparação à cepa original.
O artigo, em versão inicial para publicação, diz ainda que o novo vírus tem a capacidade de escapar da imunidade que pessoas previamente infectadas têm, podendo haver reinfecção.
Essa maior eficiência na replicação pode estar relacionada ao aumento recente na incidência nos anos de 2023 e 2024. A variante já foi descrita em pesquisa inicial publicada na semana passada.
Neste ano, infecções por Orov foram identificadas em áreas não endêmicas, nas cinco regiões brasileiras. A doença é endêmica no Norte, onde ocorreram 83,2% das infecções. Na Bahia, foram confirmadas as duas primeiras mortes por oropouche no mundo.
O estudo combinou dados genômicos, moleculares e sorológicos do Orov do Brasil de 1º de janeiro de 2015 a 29 de junho de 2024. Os dados de triagem molecular incluíram 93 pacientes com doença febril entre janeiro de 2023 e fevereiro de 2024 no estado do Amazonas, os genômicos incluíram duas sequências genômicas do Orov de pacientes e os sorológicos foram obtidos a partir de testes de anticorpos neutralizantes comparando a cepa original do Orov e a cepa epidêmica de 2024.
“A extensão com que essa replicação mais rápida se traduz em uma maior transmissibilidade do Orov pelos vetores permanece incerta, mas é plausível que essa aptidão viral possa levar a um aumento na viremia [vírus circulante no sangue], resultando em uma infecção mais eficiente dos vetores durante a alimentação sanguínea”, diz o artigo.
Ainda de acordo com o estudo, o soro coletado em 2016 de indivíduos previamente infectados pelo Orov mostrou pelo menos uma redução de 32 vezes na capacidade neutralizante contra a nova cepa em comparação com o protótipo.
O coautor do estudo, Pritesh Lalwani, da Fiocruz Amazônia, afirma que estudar a resposta imunológica é importante para, futuramente, termos vacinas ou terapêuticas para a doença.
“Estudos futuros são super importantes, porque estamos apenas começando a entender o que está acontecendo. Mas o que já observamos é que essas mutações facilitam a replicação maior, o que provavelmente está envolvido com essa disseminação do vírus.”
A maior disseminação na região amazônica pode ser explicada ainda por fatores ambientais, hipótese a ser confirmada em estudos posteriores. Pesquisadores dizem que eventos climáticos extremos se tornaram mais frequentes na Amazônia, o que pode ter alterado a dinâmica de transmissão endêmica e epidêmica do vírus.
Uma pesquisa anterior mostrou que a nova linhagem se espalhou silenciosamente na década de 2010 até a sua detecção pela primeira vez na cidade de Tefé (AM), em 2015.
Paisagens florestais fragmentadas e a perda de vegetação devido ao desmatamento e expansão do uso agrícola foram apontados como principais impulsionadores da transmissão pelos cientistas.
Segundo pesquisadores, o oropouche já chega a 19 estados brasileiros.
Sintomas da febre oropouche
O vírus é transmitido pelo mosquito Culicoides paraensis, conhecido popularmente como maruim
O quadro clínico é semelhante ao da dengue e da chikungunya. Os sintomas são dor de cabeça, dor muscular e articular, febre, tontura, dor atrás dos olhos, calafrios, fotofobia, náuseas e vômitos.
Parte dos pacientes pode apresentar recorrência dos sintomas ou apenas febre, dor de cabeça e dor muscular após uma a duas semanas do início das manifestações iniciais. Os sintomas duram de dois a sete dias, em média. Na maioria dos pacientes, a evolução da febre do oropouche é benigna e sem sequelas.
Com o avanço dos casos da febre oropouche e o anúncio de que os anticorpos do vírus foram encontrados em quatro bebês que nasceram com microcefalia e em um feto natimorto, o Ministério da Saúde e especialistas da área estão reforçando a necessidade de que todos os casos dessas malformações no país sejam notificados e investigados.