O feriado pela Proclamação da República na sexta-feira, 15 de novembro, encolhe a próxima semana, mas não a relevância da agenda local e internacional recheada de dados de atividade, resultado das contas públicas e discursos de dirigentes do Federal Reserve (Fed), o banco central americano.
Parte dessa agenda é padrão e atualiza estatísticas livre de paixões. Porém, desta vez, a avaliação de indicadores será temperada pela repercussão dos eventos que dominaram a primeira semana de novembro e têm efeitos no médio e longo prazo: as eleições norte-americanas e o pacote de corte de despesas obrigatórias no orçamento do governo.
Definida na quarta-feira, 6 de novembro, a vitória acachapante de Donald Trump à presidência dos EUA, que descortina um cenário econômico mais protecionista e inflacionário, provocou imediato fortalecimento do dólar e juros dos títulos do Tesouro americano – benchmark global de renda fixa.
No Brasil, os ativos replicaram a tendência, mas pontualmente. Prevaleceram a expectativa com o pacote de corte de gastos e o efeito prático do desmonte de posições de hedge contratadas por apostas na eleição americana.
Mas o empenho do governo de, enfim, encarar as despesas foi testado logo no início da semana. A expectativa com o “pacote”, mesmo sem detalhamento, produziu efeito antecipado. Tirou câmbio e juros das alturas e realinhou prêmios de risco sem interferir na decisão do Copom que cumpriu o script, acelerou a alta da Selic e, mais uma vez, alertou sobre a política fiscal.
Os prêmios de risco avançaram nos preços dos ativos com o resultado da eleição nos EUA, mas foram rapidamente limados no mercado local.
O dólar, em queda e rompendo o suporte de R$ 5,70 na quarta-feira, 6, à tarde, após atingir R$ 5,86 na abertura dos negócios, sugere que as medidas do governo terão o condão de restabelecer a credibilidade do arcabouço fiscal, aliviar o câmbio e, desse modo, conter importante pressão que afasta a inflação da meta. A torcida é grande, mas o resultado pode não ser tão simples.
A expectativa é positiva quanto aos cortes de gastos, mas a “prova dos nove” levará algum tempo, pois as medidas dependem do Congresso. Em 2025. Mas há confiança no mercado e ela poderia impulsionar a troca da guarda no comando do Banco Central (BC) que tem data marcada: 1º de janeiro.
Definir a composição da nova diretoria importa porque a instituição tem desafios à frente. O dólar segue forte; a inflação, sobretudo de serviços, resiste; as expectativas inflacionárias não recuam e explicam o início de um ciclo pesado de alta da Selic que, na quarta, 6 de novembro, subiu a 11,25%.
Essa decisão do Copom sacramentou projeções de ajuste de mais 0,50 ponto percentual em dezembro, quando a Selic deverá chegar a 11,75% – idêntica à observada em dezembro de 2023. E, a despeito de aumentos adicionais para até 13% contratados por algumas instituições, o fim deste ano será desanimador. Indicará que, no quesito custo do dinheiro, o País não saiu (mesmo) do lugar.
O juro real, de 6,81% em dezembro de 2023, um ano depois estará em 6,84%. Projetado 12 meses à frente, pela MoneYou, o juro real é 8%, o 3º mais alto entre 40 países, ultrapassado por 15,18% da Turquia e 12,19% da Rússia.
Risco de desgaste na estreia de Galípolo
Resumo da ópera: o trabalho do BC na condução da política monetária, sob duras críticas do presidente Lula inclusive, não surtiu o efeito desejado ou o esperado sob o prisma do regime de metas de inflação vigente no Brasil.
Seja pelo aumento dos preços de alimentos e energia – somado a pressões externas, expansão fiscal e descrédito no controle das contas públicas – as estimativas de inflação não convergem à meta de 3%. E a desancoragem vai sobrecarregar o BC de Gabriel Galípolo, o próximo presidente da instituição.
A expansão do PIB acima do esperado por analistas, mas que Lula gostaria de ver maior, é um atalho para críticas quanto à necessidade de manutenção do juro altíssimo para cumprimento da meta de inflação, considerada baixa por economistas próximos ao governo. A Selic está em dois dígitos há 23 meses.
Até por essa pressão que ronda a política monetária – e que não será necessariamente neutralizada pelo otimismo com o corte de gastos em favor do arcabouço fiscal – a contagem regressiva para a sucessão no comando do BC deve acelerar. Mas não é só o rodízio na presidência que conta.
É igualmente relevante a tripla indicação pelo presidente Lula para o preenchimento de cargos de diretores, cujos mandatos expiram em 31 de dezembro. Um deles é o próprio Galípolo. Já aprovado pelo Senado para a presidência do BC, ele deixará a Diretoria de Política Monetária.
A escolha de Lula para esse posto é particularmente importante, inclusive, para evitar especulações. A expectativa é que o candidato tenha experiência e trânsito no mercado financeiro, uma vez que essa diretoria é responsável pelas operações monetárias e cambiais do BC em interface direta com instituições.
Diretores que deixam o BC: Otavio Damaso, há quase uma década na Regulação; e Carolina de Assis Barros, de Relacionamento – cargo que assumiu em janeiro deste ano. Até então, ela liderava a Administração.
O ritual de aprovação dos candidatos ao BC recomenda urgência em função do calendário. Os indicados deverão ser sabatinados pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e, aprovados, dependem do crivo do Plenário.
Embora a primeira reunião do Copom de 2025 – sob nova direção – esteja distante (28 e 29 de janeiro), o Congresso entrará em recesso em 23 de dezembro, retomando as atividades em 2 de fevereiro.
O Copom pleno tem nove membros e já deliberou sobre a Selic com gente a menos. Entretanto, em meio a um ciclo de reaperto monetário, o desfalque de um terço do colegiado na estreia do “novo” BC é risco desnecessário.
Pesará contra a credibilidade da decisão sobre a taxa básica brasileira em um cenário externo em franca mutação. Um desgaste dispensável para Galípolo – o primeiro presidente do BC autônomo aprovado pelo presidente Lula.