A lição de casa da Turquia (que deveria servir de exemplo para o Brasil)

A lição de casa da Turquia (que deveria servir de exemplo para o Brasil)


Medidas populistas e frequentes intervenções do governo na autoridade monetária afastaram investidores da Turquia nos últimos anos, provocando uma forte desvalorização cambial e uma disparada na inflação.

Uma reviravolta nas políticas econômicas do país, contudo, tem gradualmente restaurado a confiança do mercado. A mudança de postura do presidente Recep Tayyip Erdogan teve início em meados de 2023, quando o dólar já havia mais que quadruplicado em relação à lira turca em menos de quatro anos.

Um dos marcos dessa transição foi a chegada da economista Hafize Gaye Erkan, ex-co-CEO do First Republic Bank, ao comando do Banco Central da República da Turquia (CBRT).

Sob sua liderança, o banco deu início a um agressivo aperto monetário, elevando a taxa de juros de 8,5% para 50%. Em fevereiro, Erkan foi substituída por Fatih Karahan, ex-membro do Federal Reserve de Nova York, que concluiu o ciclo com mais duas altas de juros.

No front fiscal, o governo também tem agido para reduzir o déficit primário, previsto para encerrar 2024 em 5% do PIB, abaixo da projeção inicial de 6,4%. O plano para 2025 inclui cortes de gastos equivalentes a 1,5% do PIB e um aumento na arrecadação de 0,9% do PIB. O objetivo é reduzir o déficit para 3,1% em 2025 e 2,5% até 2027.

Como resultado das políticas monetárias e fiscais mais restritivas, a inflação anual, que atingiu 85% em novembro de 2022, recuou para 47%. As projeções do CBRT indicam que o índice pode fechar 2025 em 21% e 2026 em 12%, abrindo espaço para cortes adicionais nos juros. Nesta semana, o primeiro corte foi realizado, com a taxa reduzida de 50% para 47,5%.

O foco, segundo o vice-presidente Cevdet Yilmaz, é coordenar os esforços fiscais e monetários para trazer a inflação a um dígito.

Embora a austeridade econômica tenha diminuído a popularidade do partido de Erdogan — que teve seu pior desempenho em décadas nas eleições provinciais, perdendo em 36 das 81 províncias para o Partido Republicano do Povo (CHP), da oposição —, a relação com investidores está em um de seus melhores momentos.

A bolsa de Istambul caminha para fechar o ano com ganhos de 34%, superando o Nasdaq, que subiu 30% amparado por investimentos em inteligência artificial.

Nos últimos três anos, a bolsa turca acumulou alta de 440%, impulsionada inicialmente por investidores locais buscando proteção contra a inflação. Em 2024, no entanto, o mercado internacional tem sido um dos principais motores do crescimento.

Desde meados de 2023, o número de investidores estrangeiros na bolsa aumentou mais de 50%, com a alocação passando de 800 bilhões para quase 2 trilhões de liras turcas (cerca de US$ 56 bilhões).

O percentual de participação de estrangeiros também subiu, de 27% em junho de 2023 para 37%, embora ainda distante dos mais de 60% registrados antes da pandemia.

Agências de classificação de risco estão reavaliando positivamente a Turquia. Fitch, Moody’s e S&P elevaram o rating do país neste ano, com S&P e Fitch classificando-o em BB-. A Fitch destacou a redução das intervenções cambiais e o fortalecimento das reservas internacionais, que subiram para US$ 149 bilhões (brutas) e US$ 41 bilhões (líquidas). A projeção é de que as reservas alcancem US$ 158 bilhões até o final do ano e US$ 165 bilhões em 2025.

A S&P elogiou a postura do CBRT, destacando que a política monetária rigorosa estabilizou a lira, reduziu a inflação, fortaleceu as reservas e promoveu a desdolarização do sistema financeiro.

Apesar da menor intervenção no câmbio, a lira teve uma desvalorização menor do que outras moedas emergentes, como o real. Enquanto o dólar subiu 25% no Brasil no ano, a alta frente à lira foi de 19% — abaixo da inflação do país.

Uma maior confiança na lira a longo prazo seria um próximo passo para reconquistar a credibilidade do mercado, na avaliação da S&P. A boa notícia é que o câmbio caminha para encerrar o ano em 35 liras por dólar, melhor do que a previsão de 40 liras feita pela própria agência de classificação de risco.

“A lira turca mostrou uma resiliência surpreendente durante as eleições dos EUA e foi uma das poucas moedas de mercados emergentes a se fortalecer após os resultados”, afirmaram economistas do banco ING. Contudo, com o início da política de corte de juros, o banco holandês espera alguma volatilidade cambial.

Para o Banco Central da Turquia, que ainda considera preocupantes os níveis atuais de inflação, os próximos passos da política monetária dependerão dos indicadores econômicos. Segundo projeções da Reuters, a taxa de juros, atualmente em 47,5%, pode cair para algo entre 25% e 33% em 2025.



Fonte: NeoFeed

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