A bolsa brasileira pode ser a mais atrativa do momento entre os mercados emergentes, segundo a gestora global britânica Schroders, com cerca de US$ 1 trilhão sob gestão. O problema é que ninguém quer saber de mercados emergentes neste momento. Isso mostra que não há uma perspectiva de grande alta para o curto prazo, mas com certeza há para o longo prazo.
Essa é a visão de Pablo Riveroll, diretor de renda variável da Schroders para Brasil e América Latina, responsável por ajudar todas as estratégias da gestora na alocação de ações dessa regiões (como mercados emergentes, Brasil e global), tendo hoje US$ 17 bilhões sob sua gestão.
Riveroll está bem construtivo com a tese brasileira para quando o cenário mudar. Isso significa o dólar enfraquecer e a economia americana desacelerar para dar espaço para os alocadores distribuírem seus recursos pelo planeta e ligarem o modo risk on.
Esse cenário ficou ainda mais distante nas últimas semanas com a inflação atingindo o patamar de 3,5% em 12 meses, o que deve fazer o Federal Reserve, o banco central americano, postergar o início da queda das taxas de juros – no momento, as apostas são de que isso vai começar em setembro, mas não há consenso no mercado.
Em passagem pelo Brasil, Pablo Riveroll falou sobre essa visão do Brasil. Confira alguns trechos:
Como está a alocação no Brasil: sobrealocado ou subalocado?
Estamos sobrealocados em Brasil, na nossa estratégia para emergentes. Na verdade, o Brasil é a nossa posição de mais convicção entre os emergentes hoje. O País está extremamente descontado e vemos isso em algumas métricas. Isso indica um bom momento de entrada. O valor esperado da bolsa em relação à renda fixa quase sempre foi menor em toda a janela histórica, mas agora está o contrário, por exemplo. Mas isso não significa que o capital estrangeiro irá investir no Brasil em breve.
Por quê?
Basicamente porque o dinheiro não está vindo para nenhum emergente. Então, mesmo que o Brasil seja o principal candidato, não virá. Com a perspectiva de juros mais altos nos EUA – e mesmo assim uma alta da bolsa com economia forte -, o mercado americano está atraindo todos os recursos do mundo e os investidores estão fugindo de emergentes ou de qualquer ativo de maior risco. Se nos próximos anos tivermos outro momento de desvalorização do dólar, teremos maior chance para o Brasil novamente.
“O mercado americano está atraindo todos os recursos do mundo e os investidores estão fugindo de emergentes ou de qualquer ativo de maior risco”
E quando isso pode mudar?
Não sabemos exatamente quando, mas sabemos o que tem de acontecer. O dólar precisa se desvalorizar frente a moedas emergentes e a China precisa voltar a crescer e impulsionar o mercado de commodities. Dessa forma, os mercados emergentes retomam um espaço no portfólio global. Mas, para dar uma perspectiva sobre isso, no nosso fundo global, o investimento em Brasil está bem baixo.
Por que o Brasil está mais atraente que seus pares emergentes?
Simplesmente porque está mais descontado e também porque está em uma posição estratégica interessante na disputa geopolítica mundial. Rússia e China têm restrições para fazer negócios. E a Índia, apesar de interessante, parece muito cara. O México tem ganhado espaço nas discussões por ser um dos principais beneficiários do nearshoring. Mas a verdade é que sua bolsa de valores não reflete isso, com as grandes companhias abertas sendo de telecom e de consumo. Esse case de México seria mais para mercados privados. E o Brasil mantém bom relacionamento com todos os grande países, o que nesse cenário geopolítico instável parece ser uma grande vantagem.
Quais são os setores que vocês mais estão investidos no Brasil e em quais papéis?
Nós não falamos de papéis. Mas os setores seriam utilities, elétrico e saneamento, pois vemos muitos investimentos em infraestrutura. No setor financeiro, porque vemos novos entrantes e uma dinâmica interessante, e pelo segmento de investment banking ser sempre o primeiro a aquecer com a retomada econômica. Outros setores são o industrial, o de saúde e o de varejo – vemos alguns vencedores claros para os próximos anos. E, por fim, papel e celulose, para capturar exportação em dólar.
Entendi que o momento atual é mais incerto, mas vocês acreditam na valorização do Brasil no médio e no longo prazo?
Com certeza. O Brasil está em alguns grandes temas de investimento global, como transição energética. Por um tempo, esse tema estava sendo mal interpretado, com os investidores globais ESG não aceitando investimentos em mineradoras e petroleiras, setores fortes do Brasil. Mas, hoje, já houve um amadurecimento nessa questão em que não é possível fazer uma transição energética sem esses setores. E petroleiras podem ser mais a solução do que o problema se estão engajadas na transição energética. Isso é muito bom para o Brasil. Acho que a prova de que estamos apostando no Brasil é que fizemos três contratações de analistas para a estratégia de ações Brasil recentemente, aproveitando um momento de baixa para assets locais, em que o mercado está muito subalocado em ações. A alocação de fundos em Brasil está nas mínimas históricas, em 9,6%. Desde 2000 apenas em 2016 estava menor, em 8,5%. Nós gostamos de atuar no contra ciclo.