A sabatina do diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, promovida pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado na terça-feira, 8 de outubro, causou uma sensação diferente para quem se acostumou com a polarização política dos últimos anos no Congresso Nacional.
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para substituir, a partir de janeiro de 2025, o atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto – indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro -, Galípolo defendeu a autonomia e a independência do BC com a mesma linha de argumentos usada por Campos Neto.
“A autonomia técnica e operacional do BC é aquilo que foi determinado e aquilo que os diretores devem perseguir e seguir”, disse Galípolo, em uma das inúmeras vezes que teve de se referir ao tema ao longo da sabatina, arrancando elogios até dos senadores ligados ao bolsonarismo.
Seguro, paciente e didático, Galípolo respondeu às perguntas dos senadores por quase quatro horas, com uma atuação impecável: assertivo, não hesitou uma vez sequer, fugiu de ironias e não deixou de responder nenhuma pergunta.
Sua atuação acabou se refletindo no placar unânime de aprovação à indicação na CAE, por 26 votos a favor – aprovação confirmada horas depois, na votação em plenário do Senado, onde recebeu 66 votos a favor e 5 contrários.
Embora a aprovação do nome de Galípolo fosse esperada – o futuro presidente do BC fez um grande tour nos gabinetes do Senado para conversar pessoalmente com os senadores –, especialistas do mercado ouvidos pelo NeoFeed destacaram alguns sinais.
O economista Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central que hoje vive em Washington, nos Estados Unidos, onde leciona na Universidade Georgetown, não se surpreendeu com o discurso de Galípolo, alinhado ao do atual presidente do BC.
“Corretamente não há nada para Galípolo ganhar inovando, não agora”, diz ele. Volpon afirma que o caminho do novo presidente do BC, pelo menos no curto prazo, deverá ser tranquilo.
“Enquanto houver um crescimento relativamente robusto e desemprego baixo não haverá pressão incontornável”, afirma Volpon. Ele prevê que Galípolo tem condições de fazer o BC seguir adotando uma política monetária como a atual, dependendo dos indicadores.
“Ele também deve estar apontando para o Focus e a expectativa de queda de juros ainda em 2025”, observa Volpon. “Se conseguir entregar isso dentro da meta, vida tranquila.”
Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, citou a atuação política do sabatinado, interagindo bem com os parlamentares, e disse que Galípolo falou como presidente do BC ao ser perguntado sobre o arcabouço fiscal.
“Ele foi preciso ao dizer que o BC não comenta política fiscal, e sim o impacto que teria na inflação, e também defendeu a autonomia financeira do banco, lembrando que a instituição está perdendo técnicos para o mercado financeiro e precisa rever a política de remuneração”, afirmou Agostini.
O economista da Austin também notou o preparo de Galípolo nas respostas sobre autonomia do BC, que tende a sair do embate entre Campos Neto e Lula. “Vai ter pressão e pode ter pressão, mas Galípolo passou a imagem de que será independente.”
Guardião da moeda
O futuro presidente do Banco Central começou a ganhar a confiança dos senadores em sua fala de apresentação, antes de responder às perguntas dos senadores. Depois de expressar a enorme responsabilidade que o cargo lhe compete, como guardião da moeda e presidente da autoridade monetária, Galípolo foi direto ao esclarecer como tem sido sua relação com Lula.
“Toda vez que encontrei o presidente Lula, escutei de forma enfática e clara a garantia da liberdade na tomada de decisões, e que o desempenho da função deve ser orientado exclusivamente para o bem do povo brasileiro”, disse Galípolo.
Ao longo da sabatina, quando senadores da oposição voltaram ao tema, Galípolo voltou a citar Lula e reforçou o discurso não de indicado pelo governo, mas como futuro presidente do Banco Central.
Depois de enfatizar que “seria muito leviano” dizer que Lula fez qualquer tipo de pressão desde que chegou ao BC, não titubeou ao ser questionado se negaria um pedido do presidente: “Essa é uma prerrogativa dos diretores e do presidente do órgão, de atender o que é o arcabouço institucional do BC”.
De resto, suas declarações sobre juros, dívida pública, inflação e até o tema das bets foram muito semelhantes às feitas por Campos Netos nas últimas semanas. Segundo Galípolo, cabe ao BC colocar a taxa de juros em patamar restritivo o suficiente pelo tempo que for necessário para atingir a meta de inflação.
“A meta de inflação é 3%, bandas servem para absorver choques eventuais e não para reduzir esforço da política monetária”, disse, advertindo que não cabe a à autoridade monetária “essa liberdade para ter uma concepção elástica” do que é a meta de inflação.
Galípolo também admitiu que o País deve assistir a um processo de desinflação mais lento e mais custoso, acrescentando que o BC deve ser mais conservador para garantir que a taxa de juros esteja num patamar adequado.