O dólar falou mais alto e não deu outra: o governo antecipou o anúncio do corte de gastos em 2024. A contenção será de R$ 15 bilhões. Se será suficiente para acalmar os agentes financeiros, a abertura dos negócios na sexta-feira, 19 de julho, dirá.
Se convencido, o mercado deverá reprecificar fortemente os ativos porque o dólar saltou, na quinta-feira, 18 de julho, 1,89%, para R$ 5,58 – taxa mais elevada desde 2 de julho, quando alcançou R$ 5,70. Com a arrancada do dólar, as taxas de juros avançaram quase 2% no mercado futuro. Os prazos mais longos voltaram a 12% ao ano.
No fim da tarde, após a reunião da Junta Orçamentária – com a participação do presidente Lula – o ministro Fernando Haddad anunciou o corte de R$ 15 bilhões, sendo um bloqueio de R$ 11,2 bilhões e um contingenciamento de R$ 3,8 bilhões de despesas.
O ministro explicou que o bloqueio acontece em virtude do excesso de dispêndio e o contingenciamento em virtude da receita, “particularmente em função do fato de que não foram resolvidos os problemas pendentes no STF”.
Como esperado, o corte nas despesas para o cumprimento das regras fiscais poderia ser representado (e foi) por dois mecanismos: bloqueio e contingenciamento.
Tecnicamente, o bloqueio ocorre caso despesas obrigatórias cresçam mais de 2,5% estabelecidos no arcabouço fiscal; o contingenciamento é prescrito quando as receitas não avançam o esperado para cobrir as despesas e colocam em risco a meta fiscal – fixada em zero neste ano e no próximo.
No sentido de mensurar as expectativas, pesquisa realizada pelo BTG com 33 participantes do mercado financeiro, entre 3 e 12 de julho e divulgada na terça, 16 de julho, revelou que a maioria, 75% dos consultados, estimava a necessidade de contingenciamento acima de R$ 10 bilhões para que a meta fiscal seja alcançada, mas apenas 15% acreditavam que o governo de fato entregaria algo dessa magnitude, sendo que 30% esperavam nenhum contingenciamento. O contingenciamento anunciado foi de R$ 3,8 bilhões.
Quanto ao bloqueio, 63% dos participantes da pesquisa BTG acreditavam que o governo deveria implementar um bloqueio entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões. Contudo, apenas 30% dos participantes consideravam que isso aconteceria. O bloqueio anunciado foi de R$ 11,2 bilhões.
Em relação à meta fiscal de 2024, 30% dos participantes da sondagem acreditavam que ela será cumprida; 24% que não será cumprida, mas que o governo deixará os gatilhos funcionarem, sem alterar a meta. O restante dos pesquisados, 46%, acreditavam que a meta sofrerá alteração até o fim do ano.
Para 2025, o ministro Fernando Haddad já garantiu (e anunciou) o corte de R$ 25,9 bilhões em despesas obrigatórias, resultado de um “pente-fino” em benefícios sociais e previdenciários irregulares. A ver se a intenção se transformará em decisão.
De todo modo, essa perspectiva de corte em 2025 foi comemorada e decisiva para derrubar a taxa de câmbio que caiu de R$ 5,70 para cerca de R$ 5,45 em duas semanas. Mas a moeda poderia estar a R$ 5 ou menos. Preço compatível com o retorno do título do Tesouro americano de 10 anos, que está em torno de 4,20%.
Alexandre Mathias, head de research e estrategista-chefe da Monte Bravo Corretora, lembra que, neste ano, até abril, a taxa média do Treasury – benchmark global de renda fixa – foi de 4,27%, enquanto a média da taxa de câmbio no Brasil foi de R$ 4,92.
Ao NeoFeed, o economista observou que a desvalorização de 10% do real ante o dólar, desde então, reflete o fim do ciclo de corte da Selic, a percepção de que a dívida brasileira é elevada, crescente e cara e discursos ambíguos de autoridades que tiraram a credibilidade da âncora fiscal e colocaram em dúvida a conduta do Banco Central, a partir de 2025 sob novo comando.
Cenário pode melhorar?
Especialistas de bancos, corretoras e consultorias se debruçavam sobre os dados. A torcida é para que o governo restabeleça a credibilidade do arcabouço que sofre arranhões desde abril. Um desgaste produzido pela mudança nas metas fiscais, resistência do governo a corte de gastos – talvez agora superado – e defesa de um equilíbrio apoiado em aumento de receitas visto como insustentável.
Informação crucial do documento a ser apresentado na segunda-feira, 22 de julho, no Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do terceiro bimestre é a estimativa do governo para o déficit previsto para o ano.
Do primeiro para o segundo relatório bimestral, o rombo escalou de R$ 9,3 bilhões para R$ 14,5 bilhões. Aumento que não abalou a confiança da equipe econômica no cumprimento da meta, uma vez que o arcabouço fiscal prevê tolerância de 0,25% do PIB para mais ou para menos da meta zero deste ano. Margem que autoriza déficit de até R$ 28,8 bilhões.
Se convincentes, as informações a serem divulgadas na segunda-feira poderão respaldar uma visão mais positiva para as contas públicas ao menos no curto prazo. No melhor cenário – e sem a pressão de declarações dúbias – as expectativas inflacionárias podem refluir e tornar mais consistente a percepção de que o Copom reduzirá a Selic, a partir do segundo trimestre de 2025. Por ora, o mercado prevê corte só a partir de maio e de apenas 1 ponto percentual até o encerramento do ano. Um aperto e tanto.