Fundador e diretor da Universa Investments, Mark Spitznagel não é o primeiro nem será o último gestor a prever o estouro da bolha do mercado de ações nos Estados Unidos, que vive um rally de valorização em meio à expectativa de queda dos juros pelo Federal Reserve, o banco central dos EUA.
Spitznagel, porém, tem autoridade para falar do assunto. Seu fundo de hedge com US$ 16 bilhões sob gestão é especializado em mitigar o risco de um evento raro e devastador no mercado de ações conhecido como cisne negro – termo cunhado pelo gestor Nicholas Taleb, autor do best-seller de 2007 “O Cisne Negro”. Taleb, mentor de Spitznagel, hoje é consultor da Universa.
Os fundos que apostam na estratégia de risco de cauda – concebida para lucrar com oscilações muito raras dos preços dos ativos – se apoderaram da imaginação dos investidores durante a crise de 2008, ao gerar grandes lucros, enquanto os mercados caíam fragorosamente. Essa percepção foi reforçada durante os primeiros dias do surto de coronavírus em 2020, quando os mercados estavam extremamente caóticos e alguns fundos, incluindo o Universa, saíram-se como grandes vencedores.
Em seu currículo, Spitznagel coleciona resultados espetaculares desde a criação de seu fundo de hedge, em 2008, inclusive ganhando US$ 1 bilhão em um único dia, com uma forma de atuação de mão dupla. Uma delas é apostar na estratégia de risco de cauda, o que já gerou um retorno de mais de 4.000% para os investidores. A outra é ignorar solenemente visões de curto prazo para adotá-la.
Dito isso, o gestor vê agora uma grande liquidação se aproximando, na qual prevê que as ações tendem a perder mais da metade de seu valor. “Acho que estamos a caminho de algo muito, muito ruim, a maior bolha da história humana – mas é claro que eu diria isso”, brincou Spitznagel em uma entrevista ao The Wall Street Journal, ironizando o fato de seus lucros se viabilizarem em épocas de tombos do mercado acionário.
O objetivo básico da proteção que a Universa vende é deixar os gestores de fundos profissionais confortáveis em assumir esse risco e, em seguida, fornecer-lhes dinheiro extra quando surgirem pechinchas. “Permanecer com investimento passivo em ações é a melhor estratégia de longo prazo,” aconselha.
Questionado como os meros mortais sem acesso a coberturas de risco de cauda devem responder à sua previsão de estouro da bolha, Spitznagel é direto: “Provavelmente sem fazer nada.”
Sem resgate
Segundo ele, o elevado endividamento público dos EUA e as seguidas valorizações das ações – o S&P 500 bateu mais de 30 recordes este ano – tornam mais difícil a ocorrência de um resgate liderado pelo governo americano, como aconteceu em 2008.
A despeito da desaceleração benigna da inflação, mantendo baixo o índice de desemprego e a atividade econômica em bom ritmo, Spitznagel despreza a crença no chamado “pouso suave” (redução da inflação com baixo custo para a sociedade) e diz que a economia dos EUA poderá entrar em recessão até o fim do ano.
No entanto, prever, mesmo que aproximadamente, quando o mercado irá quebrar é muito mais difícil do que proteger uma carteira contra esse tombo. Spitznagel acredita que o rally continuará por meses e ficará ainda mais violento, porque o mercado está numa “fase cachinhos dourados” – crescimento econômico moderado e baixa inflação – e a tendência otimista dos investidores impulsiona o rally.
Spitznagel vê alguns sinais da crise se aproximando, observando que os cortes nas taxas de juros, esperados para terem início em setembro, são muitas vezes o ponto de partida para grandes reversões no mercado. Outro indício é a resistência na comunidade de investidores quanto a uma queda iminente.
“Você não pode se sentir um tolo por apresentar um argumento pessimista”, diz Spitznagel. Mas na prática esse pessimismo tem um preço. Gestores de fundos que não aderiram ao movimento da IA, que impulsionou a valorização das ações das empresas de tecnologia este ano, perderam o emprego, como Mike Wilson, que deixou seu posto no comitê global do Morgan Stanley, e Marko Kolanovic, do J.P.Morgan.
“Cassandras são péssimos investidores”, ironiza Spitznagel, referindo-se a gestores que fazem profecias certeiras nas quais ninguém acredita.