A C&A está com um olho no presente e outro no futuro. Os números têm mostrado consistência e permitem à rede varejista ser otimista com o que vem pela frente.
“O terceiro tri já deu certo. E a gente está confiante que no quarto tri vai dar também”, diz Paulo Correa, CEO da C&A, em entrevista exclusiva ao NeoFeed.
O executivo não esconde a satisfação com os números do balanço. Após o fechamento da bolsa de valores na noite de quarta-feira, 6 de novembro, ele falou para o NeoFeed sobre o resultado do terceiro trimestre: “os caras vão gostar. É quase gabarito aqui”.
“Os caras”, no caso, são analistas de mercado e investidores. A C&A engatou uma sequência de trimestres de recuperação. A empresa reportou uma receita operacional líquida de R$ 1,8 bilhão, crescimento de 16,7% na comparação com o terceiro trimestre de 2023.
A rede varejista vem gerando caixa suficiente para reduzir o seu endividamento para níveis confortáveis. A dívida líquida de R$ 878,1 milhões é 33,7% menor do que era há 12 meses. E a alavancagem caiu de 2,9 vezes a relação dívida líquida sobre Ebitda para uma vez.
Esse indicador é o encontro da rede varejista com os planos de expansão. Novas lojas e expansão das reformas, que tiveram início neste ano, estão em fase final de aprovação no conselho de administração.
“A perspectiva é, sim, de aumentar o investimento. Significaria começar um plano de expansão um pouquinho mais robusto, um plano de reformas mais robusto, trazendo de fato uma experiência nos pontos de venda cada vez mais interessante também no aspecto arquitetônico”, diz o CEO.
Correa enxergava o mercado pessimista com a C&A: “Esse trimestre, eu acho que todo mundo esperava uma performance menor nossa”.
Os analistas, porém, estavam confiantes. O UBS BB, por exemplo, iniciou a cobertura da empresa no fim de outubro com indicação de compra para a ação CEAB3 e preço-alvo de R$ 15 – o papel, que acumula alta de 139% em 12 meses, está sendo negociado a R$ 13,81.
Na prévia dos resultados, Iago Souza e Nina Mirazon, da Genial Investimentos, escreveram que “a C&A deve novamente entregar o maior nível de crescimento de top line entre as empresas do setor, com uma sólida performance operacional e despesas financeiras estáveis”.
O time de analistas do Itaú BBA, liderado por Rodrigo Gastim, destacou que os dados do IDAT (índice de atividade, emprego e salário) indicavam uma expansão de faturamento para empresas do setor de vestuário – principalmente pela tributação das importações, que provocou queda de 50% dos itens vindos do exterior desde agosto, segundo dados do Banco Central.
“É provável que a C&A não só continue a superar os seus pares e a ganhar share, mas também a reportar melhores métricas da carteira de crédito”, escreveram os analistas.
A Genial esperava um Ebitda ajustado de R$ 289 milhões, com uma margem de 16,6%, enquanto o Itaú BBA projetava R$ 161 milhões para uma margem de 9,3%. A C&A entregou R$ 316 milhões de Ebitda ajustado e margem de 17,6%.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista de Correa ao NeoFeed:
O terceiro trimestre foi o primeiro período com a nova tributação de compras no exterior. Isso ajudou no resultado?
Eu não consigo identificar. O que consigo identificar pelas pesquisas qualitativas que fazemos de preferência do consumidor é que desde março deste ano vimos essa preferência pelo cross border [o transporte de uma mercadoria de um país para o outro] começar a cair. Então, à medida que tem uma taxação, a lógica diz que certamente é mais uma barreira nessa relação com o consumidor. E de alguma maneira traz aquele elemento da justiça para o equilíbrio na competição. Mas pode ser que tenha de fato um impacto no consumo como um todo do vestuário nacional.
Mas e para a C&A, especificamente?
Uma coisa que é interessante é que a maior parte do nosso crescimento está vindo das lojas do segmento conceito e high, ou seja, das lojas de maior poder aquisitivo. Nesse sentido, o impacto dessa taxação não se conecta com a realidade de onde eu estou conseguindo crescer. Onde eu estou com uma performance menor do que essa média é nas lojas superpopulares, em lugares superpopulares que a renda média é menor. Aí acho que a macroeconomia tem um peso maior.
Qual foi o indicador de maior destaque no trimestre?
Tivemos um same store sales (SSS) de vestuário de 18,9%. Foi bom. É o quinto trimestre consecutivo que a gente está fazendo dois dígitos. E esse foi um dois dígitos mais alto. Acho difícil alguém chegar perto.
“É o quinto trimestre consecutivo que a gente está fazendo dois dígitos. Acho difícil alguém chegar perto”
Qual é a explicação para esse trimestre ter sido melhor?
Três coisas. Muita gente fala que o segundo trimestre foi prejudicado pelo inverno. De fato, o inverno chega entre abril, quando chega cedo, ou mais tarde, quando vai até o fim de agosto. Esse inverno chegou mais tarde, em julho, e a gente vendeu muita coleção de inverno em julho e agosto. Esse foi um fator importante nesse resultado.
Qual é o segundo?
Começamos a acelerar ainda mais o modelo do teste de escala. É um volume baixo e aquilo que está funcionando a gente escala. Trouxemos isso para a coleção primavera-verão e já tivemos no fim de agosto e começo de setembro uma série de produtos que foram muito bem. Conseguimos escalar, o que também ajudou bastante na performance do trimestre
O seu ponto final?
Por fim, mas não menos importante, a nossa estratégia Energia C&A, que a gente começou a implementar este ano, principalmente no segundo trimestre. E já no terceiro trimestre começou a dar suas contribuições.
Que tipo de contribuição?
A gente construiu, por exemplo, uma nova área jeans [dentro das lojas]. Essa nova área jeans já está em 70 lojas. E onde ela está já tem performance de 15% a 20% maior do que a loja controle. Isso significa que já tem um boost nessas 70 lojas de jeans. Outra é a nossa categoria beleza, que cresceu 64% no trimestre. Nosso aplicativo também voou baixo: a gente mais que dobrou o número o MAU (monthly active users). E o e-commerce cresceu 50%.
Como um todo, o resultado do trimestre é surpreendente?
A margem bruta foi recorde para o terceiro trimestre. A gente fez 55,1%. É também um crescimento de mais de um ponto percentual comparado com o ano passado. É o 13º trimestre consecutivo de aumento de margem bruta da companhia. Essa combinação com a disciplina financeira fez o Ebitda crescer mais de 50% em relação ao ano passado. São 17,6% de margem Ebitda ajustada, ou seja, quatro pontos a mais do que no ano passado. Em 2023, tivemos prejuízo líquido e neste ano foram R$ 52 milhões de lucro líquido. Esprememos a dívida mais um pouco e a alavancagem chegou a uma vez só a dívida líquida sobre Ebitda.
A alavancagem está, agora, em um ponto confortável?
O que falamos é que essa dívida líquida sobre o Ebitda de uma vez nos dá condição para acelerar o nosso programa de investimento. Esse é o objetivo desses próximos trimestres. A gente começa a ter muita tranquilidade para fazer um volume de investimento que nos dispusemos a fazer no [plano estratégico] Energia C&A. E agora estamos tranquilos. A dívida realmente está entrando em um nível que, eu diria, é saudável para o varejo brasileiro.
“O que falamos é que essa dívida líquida sobre o Ebitda de uma vez nos dá condição para acelerar o nosso programa de investimento”
Qual é esse volume de investimento?
Esse ainda não falamos. Mas vai aumentar o patamar que a gente vai fazer este ano [foram R$ 172,1 milhões nos nove primeiros meses de 2024]. Estamos discutindo o plano com o conselho de administração, finalizando a conversa. Mas a perspectiva é, sim, de aumentar esse investimento.
Para onde vai ser direcionado esse aumento de recursos?
Significaria começar um plano de expansão um pouquinho mais robusto, um plano de reformas mais robusto, trazendo de fato uma experiência nos pontos de venda cada vez mais interessante também no aspecto arquitetônico. Isso vai acelerar o processo. Esse é um dos vetores de como tornar a jornada mais agradável, mais fácil, mais fluida, mais rápida. E reformar as lojas e abrir novas lojas tem a ver com isso também.
Foram gastos pouco mais de R$ 62 milhões até aqui, no ano, com reformas e modelagem. Isso já começa a aparecer nos resultados?
É um dos elementos. Reformamos este ano só três lojas. E estamos reformando mais quatro agora. Serão sete lojas no total. Mas essas pequenas reformas de categorias já foram feitas em mais de 100 lojas. Essas pequenas reformas estão impactando o resultado de maneira mais significativa. E essas três lojas que a gente reformou, a do Iguatemi Porto Alegre, shopping Ibirapuera e Park Shopping Brasília, estão voando baixo desde que reinauguraram. A volumetria ainda não é tão significativa assim, porque são só três, mas estão contribuindo.
Mas servem de exemplo para continuar o projeto de reformas?
Elas estão servindo de base para o programa de reformas no ano que vem. Aí, sim, em um volume mais significativo. O ano que vem promete ser bem forte para nós. Tudo o que tudo que está acontecendo está indicando essa direção.
A barra está mais alta para continuar entregando resultados fortes?
Esse trimestre eu acho que todo mundo esperava uma performance menor nossa.
Por quê?
Porque no ano passado, ao contrário da concorrência, crescemos no terceiro trimestre 12,5%. A gente está crescendo 18% em cima desses 12,5%. Enquanto a galera no ano passado teve um retorno mais próximo do zero. Agora, no último trimestre, a nossa barra é 20%. É por isso que a gente preparou um arsenal de coisas. Queremos continuar mostrando um crescimento diferenciado em cima de um baseline alto, como a gente teve no último trimestre. Está todo mundo superconsciente desde o início deste ano que a gente tinha que evoluir na proposta, e na história como um todo, para merecer crescer acima desse baseline mais forte que a gente tinha. O terceiro tri já deu certo. E a gente está confiante que no quarto tri vai dar também.
“No último trimestre, a nossa barra é 20%. É por isso que a gente preparou um arsenal de coisas. Queremos continuar mostrando um crescimento diferenciado em cima de um baseline alto”
Pensando nesses números da situação e na situação macroeconômica do País, a empresa parece estar na contramão, afinal, o varejo cresce quando os juros estão mais baixos. O C&A Pay é um meio de pagamento que ajuda nesse sentido?
Tem mais um elemento dessa equação. Eu diria que o plantio do C&A Pay aconteceu mais ao longo do ano de 2023 e início deste ano. Se você olhar nossos resultados vai ver que a nossa base de cartões chegou a 6,5 milhões. É uma fase que traz um dos grandes objetivos que temos com essa base: a recorrência. Complementando o que você está falando, de alguma maneira o Pay tem um papel importante nessa jornada de fomentar esse relacionamento e intensificar o total spending do cliente ao longo do ano de uma maneira significativa.
Quanto é esse total spending?
O gasto médio do cliente que não tinha o cartão C&A e ele passa a ter o cartão C&A é em torno de 50% maior anualmente do que o de quem continuou sem o cartão. É a história de estar mais perto e poder conversar mais. Eu sempre brinco que conversou, vendeu mais. À medida que você adiciona conteúdo e informação, o consumo é uma consequência disso.
A C&A mudou o posicionamento da marca recentemente. Qual foi o objetivo?
Fizemos o lançamento do posicionamento da marca no início de outubro. A nossa hashtag é “a gente se encontra na C&A”. A gente se encontra tem a ver com as pessoas encontrando o que estão procurando na loja. Elas se encontram com a moda, que tem a ver também quando coloca a roupa no provador, olha no espelho e ficou bem, bonita, confiante. Tem muita coisa, vamos falar assim: encontrar os presentes, encontrar as tendências de moda agora para o fim do ano, encontrar o look do Natal e do Réveillon, encontrar o look da viagem de janeiro. Então, construímos várias histórias que tem a ver com esse momento do encontro.
Qual é esse próximo encontro?
Tem algumas ações muito legais agora para o fim do ano. Por exemplo, temos uma collab que a gente vai lançar na segunda quinzena de novembro, que está muito linda, está muito forte e vai causar. É uma marca que todo mundo tem desejo.
Qual é essa marca?
A brasileira que está mais quente lá fora neste momento: a PatBo. A Patrícia Bonaldi está fazendo uma collection espetacular com a gente. Ela recentemente fez umas collabs com com marcas internacionais, então ela está bem aquecida. É o desejo da galera atualmente, a PatBo. Estamos fazendo essa história e provavelmente vamos lançar na segunda quinzena de novembro. Vai ser muito legal. E ao mesmo tempo tem muita coisa pensada para o fim do ano.
Esse reposicionamento é marketing ou também tem estratégia de negócio?
Três coisas precisam andar fortes, ao mesmo tempo e integradas: marca, experiência de loja e produto. Nesse tripé, os três estão andando na C&A. Tem história nova de produtos, de categoria, de beleza, jeans básico… Estamos investindo e aumentando o repertório disso. Em segundo, as jornadas, com reforma de lojas, melhoria do site e da experiência do online e do aplicativo. Como tornar essas jornadas mais simples. E a terceira dimensão que é a da marca. Como fazer que tanto a jornada como produto sejam essa solução de se encontrar com a moda. Esse tripé tem que estar o tempo inteiro borbulhando com força e avançando, trazendo novidades, diferenciação e inovação.