Sociedades se tornam mais resilientes em momentos de crise – 22/05/2024 – Equilíbrio


Do Império Romano à civilização Maia, a história está repleta de colapsos sociais. Tradicionalmente, historiadores estudaram esses declínios qualitativamente, mergulhando nas reviravoltas de sociedades individuais.

Mas cientistas como Philip Riris adotaram uma abordagem mais ampla, buscando padrões duradouros de comportamento humano em uma escala mais vasta de tempo e espaço. Em um estudo publicado na semana passada, esses métodos permitiram que Riris e seus colegas respondessem a uma pergunta profunda: por que algumas sociedades são mais resilientes do que outras?

O estudo, publicado na revista Nature, comparou 16 sociedades espalhadas pelo mundo, em lugares como o Yukon e o interior da Austrália. Com modelos estatísticos poderosos, os pesquisadores analisaram 30 mil anos de registros arqueológicos, rastreando o impacto de guerras, fomes e mudanças climáticas. Eles descobriram que passar por declínios permitiu que as sociedades superassem choques futuros mais rapidamente. Quanto mais frequentemente uma sociedade passava por eles, mais resiliente ela se tornava.

“Com o tempo, você sofre menos, essencialmente,” afirma Riris, um arqueólogo da Universidade de Bournemouth, na Inglaterra. “Tende a não haver colapso total.”

Os pesquisadores rastrearam a história das sociedades aproveitando a maneira como os arqueólogos contam o tempo. A maioria dos materiais orgânicos, seja carvão ou conchas de mariscos, contém traços de Carbono 14 radioativo (C-14), que se degrada gradualmente ao longo de milhares de anos. Medindo o C-14 restante em um sítio arqueológico, os pesquisadores podem estimar sua idade.

Essa abordagem também pode rastrear mudanças populacionais. À medida que grupos humanos crescem, eles queimam mais madeira, consomem mais alimentos e deixam mais lixo, tudo o que pode ser datado. Quando esses grupos diminuem, seus sítios se tornam mais raros.

Riris e seus colegas reuniram informações de mais de 40 mil medições de C-14 de 16 populações. Eles então examinaram todas as sociedades em busca de sinais de quedas súbitas e grandes recuperações.

Toda população sofreu declínios. Alguns duraram apenas algumas gerações, enquanto outros persistiram por muito mais tempo. Cerca de 8.200 anos atrás, o Oriente sofreu uma queda populacional e não se recuperou por mais de 2.000 anos.

As maneiras como as pessoas viviam levavam a diferentes ritmos de colapso e crescimento. Sociedades que criavam gado ou cultivavam a terra cresciam mais rapidamente, mas também se tornavam mais propensas a declínios. Riris especula que cultivar plantações ou cuidar de rebanhos de animais tornava as pessoas mais vulneráveis às mudanças climáticas.

John Haldon, historiador da Universidade de Princeton que não participou do novo estudo, ficou impressionado com quantos dos declínios coincidiram com mudanças climáticas. “O que isso nos diz é que o clima é nosso maior ponto fraco,” diz ele.

Riris e seus colegas procuraram fatores que explicavam por que algumas sociedades, em alguns casos, sofriam declínios longos e profundos, enquanto outras experimentavam quedas menores em suas populações e se recuperavam mais rapidamente.

Uma característica que se destacou foi a frequência dos declínios. Pode-se esperar que passar por muitos deles desgaste as sociedades, tornando-as mais vulneráveis a novas catástrofes. Mas o oposto parece ter ocorrido; sociedades que experimentaram declínios frequentes passaram a se tornar mais resilientes, experienciando quedas menos severas e recuperações mais rápidas.

O estudo sugere que as sociedades na Península Coreana, nas planícies centrais da China e no Caribe, em particular, exibiram uma capacidade aprimorada de recuperação.

O padrão de maior resiliência diante de efeitos estressores repetidos é semelhante ao que os ecologistas observam quando estudam a história das florestas. Ecossistemas que passam por perturbações frequentes tornam-se os mais resilientes. As pessoas não são árvores, é claro, e Riris e seus colegas não têm certeza do motivo pelo qual as sociedades também mostram esse padrão.

Riris especula que durante os declínios, as sociedades aprendem a sobreviver e depois transmitem esse conhecimento às gerações futuras.

“Isso levou a inovações —ou tecnologias, práticas, comportamentos, conhecimentos ou tradições— sendo adotadas que permitiram que eles se saíssem melhor na próxima vez que algo ruim acontecesse,” diz ele.

Hoje, à medida que o planeta entra em uma emergência climática, vários pesquisadores estão procurando lições da história. Riris reluta em dar qualquer conselho baseado na nova análise. Se a civilização estiver à beira de um colapso de 500 anos, não será um grande consolo saber que poderia ter sido de miç anos.

“Precisamos ter clareza sobre o sucesso que estamos falando,” diz ele. Haldon concorda que é difícil usar uma história tão profunda para tomar decisões sobre políticas atuais, que tendem a se concentrar no curto prazo.

“Eles podem estar completamente corretos que essa é a maneira como as sociedades se comportam ao longo de 100.000 anos, mas isso não vai nos ajudar no presente,” afirma Haldon. “Se pudéssemos planejar 50.000 anos à frente, estaríamos em um ótimo lugar.”



Fonte: Folha de São Paulo

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