Veto à criação de imposto de grandes fortunas frustra (outro) sonho do governo de aumentar receita

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Boa parte da bancada do governo federal na Câmara dos Deputados até tentou, mas não conseguiu – mais uma vez – aprovar a criação de um imposto sobre grandes fortunas. A polêmica proposta foi rejeitada, nesta quarta-feira, 30 de outubro, por 262 deputados, contra os 136 que a apoiavam.

De autoria do deputado Ivan Valente (PSOL-SP), a proposta foi incluída como destaque no Projeto de Lei Complementar (PLP 108/24), que regulamenta o novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

A proposta do IBS, enviada pelo Executivo, é o segundo projeto voltado à regulamentação da reforma tributária. Na mesma sessão, o PLP que cria o comitê gestor do futuro IBS foi aprovado e encaminhado ao Senado para apreciação.

A rejeição do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) era esperada – o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já havia se posicionado contra o aumento da carga tributária e a proposta nunca teve grande adesão entre os deputados.

No final, a articulação de deputados governistas alinhados a partidos de esquerda pela aprovação deixou no ar a expectativa de se criar uma nova fonte de receita para o governo federal, às voltas com déficit fiscal.

Isso explicaria o momento inadequado para levá-la a votação – a rigor, a proposta deveria ser discutida na segunda parte da reforma tributária, focada na renda, que só terá início após a regulamentação da reforma sobre consumo.

A possibilidade de criar um imposto sobre grandes fortunas está prevista pela Constituição Federal. Embora nunca tivesse sido votada anteriormente, volta e meia voltou a ser sugerida. Da última vez, em 2020, surgiram propostas de projetos de lei prevendo a taxação de grandes fortunas, com o objetivo de fazer frente ao custeio dos gastos com a pandemia, que acabaram não prosperando.

Além do pouco apoio, a proposta apresentada tinha vários problemas. Ela previa que o imposto sobre grandes fortunas seria aplicável a patrimônios acima de R$ 10 milhões. O IGF teria alíquotas anuais de 0,5% para bens entre R$ 10 milhões e R$ 40 milhões, 1% entre R$ 40 milhões e R$ 80 milhões e 1,5% para valores superiores a R$ 80 milhões.

Para especialistas, a proposta esbarrou no mesmo problema das anteriores – a definição do que seria grande fortuna. Ao longo dos anos, em diversas propostas de projetos no Congresso Nacional, foram sugeridos valores que variam entre R$ 2 milhões e R$ 10 bilhões. O valor mínimo proposto desta vez, porém, era muito inferior a padrões internacionais.

Nos países do Primeiro Mundo, o padrão mínimo para considerar um contribuinte dono de grande fortuna é que seu patrimônio seja superior a US$ 1 bilhão. Na verdade, o imposto sobre os milionários é adotado por poucos os países. Na Europa, atualmente, apenas a Espanha, Noruega, Suíça e Bélgica aplicam essa medida e, na América Latina, apenas o Uruguai, a Argentina e a Colômbia.

Críticas à proposta

Helena Tuccio Teixeira, advogada do Meirelles Costa Advogados, diz que a proposta de criar um imposto de grandes fortunas apenas tornaria o País mais burocrático, e não intensificaria e nem incentivaria o empreendedorismo.

“Com isso, essa cobrança representaria um afastamento do objetivo que vem sendo perseguido pelas políticas fiscais: gerar segurança jurídica e fiscal, simplificar as formas de tributação e fomentar a economia, bem como estaria em dissonância com as práticas internacionais de tributação”, afirma.

Alessandro Fonseca, sócio da área de gestão patrimonial do escritório Mattos Filho Advogados, também criticou a proposta, afirmando que o valor mínimo de R$ 10 milhões previsto para taxação era o menor dos problemas.

“Deveríamos olhar menos aos números e mais para o conceito, como outras iniciativas tributárias que vêm sendo discutidas e causam preocupação” diz, citando a proposta em estudo pelo Ministério da Fazenda de criar um imposto mínimo sobre as pessoas físicas milionárias, que teria uma alíquota a ser definida entre 12% ou 15% da renda.

A proposta prevê uma comparação do valor da aplicação do imposto mínimo sobre a renda total da pessoa física – como ganhos de aplicações financeiras, salário, lucros e dividendos etc. – com o que ela efetivamente pagou pelo sistema atual. Se o resultado for menor, o contribuinte deverá complementar a diferença no ajuste do IR.

“Somada à proposta de taxar dividendos, vemos uma perspectiva do governo de tentar taxar tudo o que é possível; o ideal seria discutir uma proposta integrada – não apenas de grande fortuna, mas de todas as propostas que têm sido feitas”, afirma Fonseca.

Foram feitas também quatro alterações no PLP em relação ao texto-base aprovado em agosto pela Câmara. A cobrança de Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) para os planos de previdência VGBL deixados como herança foi rejeitada.

A previsão de cobrança de ITCMD na distribuição desproporcional de lucros entre os sócios das empresas foi também excluída, assim como a proibição de que empresas do mesmo grupo econômico transferissem os créditos de ICMS ou do futuro Imposto sobre Serviços (IBS) entre si.

A tentativa de alterar o texto para que o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) fosse cobrado com base no valor dos contratos de compra e venda também foi barrada. O parecer aprovado estabelece que a referência para cobrança do imposto será o valor venal do imóvel ou o valor de transferência, o que for maior.



Fonte: NeoFeed

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