Líderes da bancada evangélica querem que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), defina nos próximos dias quem será o relator do PL antiaborto que tramita na Casa.
Lira afirmou publicamente na quinta-feira (13) que a relatora do projeto será “mulher de centro e moderada”, que possa “dar espaço a todas as correntes que pensam diferente”. “E se não tiver apoio ele, simplesmente, não é aprovado, não é nem pautado”, disse a jornalistas após participar de evento em Curitiba.
Há uma previsão de que o autor do texto, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), se reúna no começo da semana com Lira para discutir possibilidades de nomes. Cavalcante é ex-presidente da frente evangélica no Congresso.
Os representantes dessa bancada defendem celeridade à tramitação do projeto. A interlocutores, Cavalcante disse que trabalhará para que o texto seja aprovado ainda neste semestre.
Líderes da direita à esquerda defendem que a relatora seja uma deputada experiente, que consiga dialogar com os diferentes segmentos do parlamento. O nome da deputada Benedita da Silva (PT-RJ), tem sido apontado como favorito até mesmo por cardeais do centrão. Além de estar em seu quarto mandato, ela é evangélica e dialoga com a direita.
Apesar disso, o nome enfrenta resistências entre parlamentares que querem ver o projeto aprovado. Uma liderança da bancada evangélica diz que é necessário escolher uma representante de partido do centro, para evitar que o debate do mérito da proposta seja contaminado pela polarização entre esquerda e direita.
De outro lado, deputados de esquerda afirmam que não seja escolhida a relatora neste momento, uma vez que trabalham para adiar a tramitação da proposta. Deputados defendem que o tema seja analisado após as eleições municipais de outubro —e apostam que, até lá, o debate possa esfriar, fazendo com que o tema nem seja analisado neste ano.
Há ainda quem defenda pressionar Lira para que a proposta seja arquivada.
Na quarta (12), os deputados aprovaram em votação-relâmpago um requerimento de urgência de projeto que altera o Código Penal para aumentar a pena imposta àqueles que fizerem abortos quando há viabilidade fetal, presumida após 22 semanas de gestação. A ideia é equiparar a punição à de homicídio simples.
O requerimento de urgência é um instrumento usado para acelerar a tramitação de uma proposta na Câmara, já que ela segue direto ao plenário, sem passar pela análise das comissões temáticas da Casa. Os deputados ainda precisam votar o mérito do texto.
O presidente da Câmara incluiu o projeto na pauta do plenário a pedido da bancada evangélica. O alagoano tenta assegurar o apoio desses parlamentares em torno do nome que ele escolher para ser seu sucessor na presidência da Casa, em 2025.
Apesar disso, Lira já indicou que o texto de Cavalcante será modificado e que o que está em discussão é a assistolia fetal (procedimento que consiste na injeção de produtos químicos no feto para evitar que ele seja retirado do útero com sinais vitais).
“O sentimento da Casa não é para avançar para liberação do aborto e também não é para descumprir os casos que já são permitidos hoje em lei”, disse na quarta.
A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) diz que é preciso aumentar a pressão de segmentos da sociedade civil contrários ao avanço da matéria.
“O que nos resta é seguir ampliando a pressão da sociedade sobre a Câmara, porque ela tem surtido efeito, ao menos no constrangimento dos parlamentares que propuseram o projeto. As manifestações de rua, posicionamento de artistas têm sido fundamentais”, diz a deputada.
“Também é importante destrinchar o conteúdo do projeto e explicar que a assistolia é o método mais seguro para gestações mais avançadas”, afirma.
Nas redes sociais, a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), disse que é pessoalmente contra o aborto, mas defende o que está previsto em lei, e classificou como “atabalhoada” a forma que foi aprovada a urgência.
“O projeto de lei, que teve sua urgência aprovada de forma atabalhoada na quarta-feira, mexe com a legislação em vigor. Além de aplicar uma pena maior para a vítima de estupro que faz aborto do que para o estuprador, impede que uma menina ou mulher estuprada possa fazer aborto após 22 semanas de gravidez”, disse.
Um líder governista da Câmara afirma, sob reserva, que não há acordo com as demais lideranças para votar o texto tal qual ele foi apresentado por Cavalcante. Ele defende também que o tema não seja analisado neste momento.
Uma deputada diz que Lira pode tentar adiar a discussão para o segundo semestre, após a realização da reunião de mulheres parlamentares do P20, que ocorre no começo de julho em Maceió (AL). O alagoano exerce a presidência do P20, que reúne parlamentares dos países do G20.
A aprovação da matéria às vésperas do evento poderá provocar críticas ao presidente da Câmara.